Saturday, October 01, 2011

Opus One

Ontem, comemoramos os 70 anos do meu pai. Data especialíssima, que mereceu um vinho a altura. Fizemos uma pequena festa, em casa mesmo, mas foi sensacional.

>> This Is The River; Mike Scott And The Waterboys; The Whole of the Moon
>> A Decolagem de um Grande Sonho; Oziris Silva; Campus

Friday, April 08, 2011

Fogo Morto

Deus, quando quer perder os homens, enlouquece-os primeiro, é o recado antigo. Não foi diferente na última quinta-feira. Até agora, contamos 12 crianças mortas, uma escola derribada e a nação estarrecida.

De certa forma, o mais forte desafio às sociedades modernas é sobreviver à loucura que nos impõe a vida e, nesse processo, emprestar à condição humana algum respeito ao próximo. O elemento coesivo do homem é exatamente a sensação de segurança e união coletiva. Daí o discurso de Péricles, que coloca nas leis os fundamentos da democracia. Quando falha o sistema, como no dia de ontem, mergulhamos na perplexidade e perdemos nossa sensação de espaço.

Nesse paradoxo, o lugar no qual se deu a tragédia merece referência: era terra inviolável. A dinâmica dos bairros na geografia carioca o sabe: Engenho Novo, Engenho de Dentro, Engenho da Rainha e, ao final, imponente, concentrador da produção de todas as demais indústrias de açúcar da era colonial, o Real Engenho. Realengo, pois é. De passado sublime, a região fez-se palco da desgraça. Na figura literária, tornou-se sítio de “fogo morto”.

Na lição da obra de José Lins do Rego, o pistoleiro “não tinha medo de ninguém. Marchava devagar. Estava só naquele mundo, sem uma pessoa, sem um ente vivo”.

A atitude do assassino foi, talvez, uma tentativa de iludir a morte, de confiar alguma dimensão a sua vida mediocrizada. Um rito canibal, quiçá: ao aniquilar seus iguais, o matador teve a ilusão de incorporar a força dos vencidos.

No clássico ensaio de James Hillman, On Paranoia, o psicólogo examina essas relações e contradições entre a revelação religiosa e o delírio da alucinação. No teor de seu texto: “suspeito que muitas idéias delirantes, das quais são sujeitos os enfermos mentais, consistem na troca da forma de um discurso figurado, ou poético, por um discurso literal. O espírito fala poeticamente, mas o homem o entende literalmente. Por exemplo, um louco declarará ser feito de ferro, e que ninguém o destruirá, mas o que o espírito quer dizer é que o homem é forte como o ferro – e o demente o toma em seu sentido literal”.

De qualquer forma, não há explicação lógica para os eventos. Todavia, enquanto formos capazes de remover os cacos e chorar pelos estranhos, seremos, também, fortes para combater o desalento sofrido por todos. Para combater por meio daquela tristeza a que se refere o Rei Salomão, a que mora no coração dos sábios e que é capaz de salvar nossa espécie.

Enfim, depois do estouro, resta o silêncio e o fogo apagado no real antigo engenho. No recreio da escola, um pátio de almas desossadas.

>> Have You Ever Seen the Rain; R.E.M.; Covering Them
>> Fernando Pessoa - Uma Quase Aurobiografia; José Paulo Cavalcanti Filho

Saturday, February 26, 2011

Os Outros - Ramón Lobo

"Não são livres aqueles que medem sua vida pela abundância de posses. Também não o são os que medem sua riqueza pela escassez, pelo pouco que possuem.
Os que vemos nessa foto são náufragos. Na maleta preta cabem nada mais do que sonhos perdidos. Apesar de estufada, nela não há jóias ou valor.
O homem que a carrega caminha curvado, abatido. Os sonhos abandonados pesam-lhe como pesadelos. Eu o imagino arrastando os pés sobre a areia suja da fronteira de Ras Jdir, em Túnis, onde uma marca invisível separa duas revoluções: uma que o faz sangrar e a outra que lhe foi roubada."
O texto acima é uma livre adaptação do blog do Ramón Lobo, publicado pelo El País. O post trata dos recentes eventos no Oriente Médio e, claro, o site do sujeito merece a visita.

>> O Lamento de Israel; Sérgio Lopes; xxx
>> Quase a Mesma Coisa; Umberto Eco; Record

Sunday, January 23, 2011

Gonzo Kitchen: Aaaaargh

Já escrevi algumas indicações excêntricas aqui neste "Gonzo Kitchen". Esta, porém, apesar de não ser propriamente uma receita, ultrapassa todas as expectativas.

Eis que, uma pesquisadora maluca da NYU resolveu produzir queijo a partir de tetas humanas. Isso mesmo, ela recolhe leite de algumas mães e processa o líquido até virar queijo... em três variações: Sweet Airy Equity, Wisconsin Bang e City Funk. A propósito, o Wisonsin Bang é um cream cheese.

Você encontra a íntegra aqui. Freak, totalmente freak.

>> Esta Terra; Caetano Veloso; Trilha Sonora de "O Bem Amado"
>> Um Homem Chamado Maria; Joaquim Ferreira dos Santos; Objetiva

Thursday, January 06, 2011

Ao Itararé

"Fizeram acordos. O Bergamini pulou em cima da prefeitura do Rio, outro companheiro, que nem revolucionário era, ficou com os Correios e Telégrafos, outros patriotas menores foram exercer o seu patriotismo a tantos por mês em cargos de mando e desmando… e eu fiquei chupando o dedo. Foi então que resolvi conceder a mim mesmo uma carta de nobreza. Se eu fosse esperar que alguém me reconhecesse o mérito, não arranjava nada. Então passei a Barão de Itararé, em homenagem à batalha que não houve."
Em 1930, Aparício Fernando de Brinkerhoff Torelly, já Barão de Itararé, discorrendo sobre a batalha de mesmo nome. Luta que, conforme afirma o nobre Barão, jamais ocorreu.

>> Sweet Sweet Heartkiller; Say Hi to Your Mom; Impeccable Blahs
>> O Golpe e a Ditadura Militar - 40 Anos Depois; Daniel Aarão Reis (org.); Edusc

Friday, December 31, 2010

Bons Anos

No início do sermão dos "Bons Anos", o padre Antônio Vieira faz bela exortação ao recomeço e ao futuro. Em sua primeira missa na capela régia, no dia 1o. de janeiro de 1642, afirmou o religioso:
"(...) Ora com isto se representar assim, com o Evangelho e o tempo parecer que nos prometem poucas esperanças de felizes anos, do mesmo tempo e do mesmo Evangelho hei de tirar hoje a prova e segurança. Deles será, pois a matéria e empresa do sermão esta: Felicidades de Portugal, juízo dos anos que vêm. Digo dos anos, e não do ano, porque quem tem obrigação de dar bons-anos, não satisfaz com um só, senão com muitos. Funda-me o pensamento o mesmo Evangelho, que parece o desfavorecia; porque toda a matéria e sentido dele é um prognóstico de felicidades futuras."
Nessa pregação, Vieira incitou o auditório a perseverar na luta desigual contra Castela e propôs soluções várias aos problemas da época. Baseou-se, ainda, no juramento de D. Afonso Henriques e nas profecias atribuídas a São Frei Gil para escrever o arrazoado e estimular os portugueses a enfrentar os tempos futuros.

Muitos anos depois, em 1925, no poema "Descobrimento", Mário de Andrade também escreveu sobre exortação e união. Dessa vez, porém, o poeta dissertava pressionado sob a égide de nossa dívida social. Abancado à escrivaninha de sua casa, na rua Lopes Chaves, Andrade alegou sentir um friúme por dentro.

"Fiquei trêmulo, muito comovido", disse o poeta. Na sequência, lembrou que: "lá no Norte, meu Deus! Muito longe de mim, na escuridão ativa da noite que caiu, um homem pálido magro de cabelo escorrendo nos olhos, depois de fazer uma pele com a borracha do dia, faz pouco se deitou, está dormindo. Esse homem é brasileiro que nem eu".

No texto, o escritor saiu de si e observou um sentimento que foi gerido na sociedade brasileira ao longo dos anos e, aparentemente, solidifica-se nos dias atuais. Apesar de todas as diferenças da nação, nós somos muitos e devemos ser um só - essa é a mensagem de Andrade acerca do futuro a ser almejado pelo Brasil.

Hoje, 2010, sem ajuda específica do governo, mas impulsionadas pelo bom momento nacional, três famílias de catadores de papel que moravam em barracos perto do Palácio do Planalto ascenderam à classe media. Fundamentados pelas lições de Vieira, relembrados pela poesia de Andrade e esperançados pela bonança contemporânea, esses brasileiros eram esquecidos e incluíram-se. Eram sozinhos e incoproraram-se ao todo, unos.

Motivo suficiente, portanto, para estourar os fogos na virada. A esses prezados que, conforme a lição de Mário de Andrade, são brasileiros como nós, fica minha mensagem de ano bom.

Somos brasileiros, somos a novidade mundial e somos um só. Feliz ano novo, que 2011 se renda a nossos desejos.

>> Eu Quero Ver Gol; O Rappa; Acústico MTV
>> Quando Fui Outro; Fernando Pessoa; Alfaguara

Thursday, December 30, 2010

El Cementerio

"Los peores de todos, sin duda, son los jesuitas. Tengo la vaga sensación de haberles hecho alguna que otra jugarreta, o quizá sean ellos los que me han hecho daño, todavía no lo recuerdo bien. O quizá eran sus hermanos carnales, los masones, iguales a los jesuitas, sólo que un poco más confusos. Aquéllos, por lo menos, tienen una teología propia y saben cómo manejarla, éstos tienen demasiadas y pierden la cabeza. De los masones me hablaba el abuelo. Junto con los judíos, le cortaron la cabeza al rey. Y generaron a los carbonarios, masones un poco más estúpidos porque se dejaron fusilar, en una ocasión, y después se dejaron cortar la cabeza por haberse equivocado en la fabricación de una bomba, o se convirtieron en socialistas, comunistas y comuneros. Todos al paredón. Bien hecho, Thiers.
Masones y jesuitas. Los jesuitas son masones vestidos de mujer."
Lendo o novo e excelente livro de Humberto Eco, "O Cemitério de Praga". Ainda sem versão para o português, você pode encontrá-lo aqui.

>> If You Run; The Boxer Rebellion; Going the Distance (Original Motion Picture Soundtrack)
>> El Cementerio de Praga; Humberto Eco;