Wednesday, March 31, 2010

Blood For Oil

Ao longo de nosso passado, sempre debatemos sobre o que somos como comunidade política e o que desejamos para o futuro de nosso país. Apesar dos avanços, tal discussão redunda poucas soluções práticas. Como dizia Gilberto Amado, nossa história desconcerta o investigador.

Nas duas últimas semanas, em função da (re)partilha dos royalties do petróleo, estivemos discutindo a divisão fiscal no Brasil e, de certa forma, quase todas as intervenções estavam submetidas a injunções apaixonadas. Enfim, parecíamos voltar ao começo de tudo. Poucos ousaram tocar em nosso problema de fundo: a arquitetura federativa brasileira.

Por óbvio, o primeiro problema prático de todas as comunidades políticas é seu financiamento. Em uma sociedade, há despesas comuns que devem ser cobertas com a contribuição de todos. Como o tributo é o retorno de uma parcela dos bens obtidos pelos membros da sociedade, é natural que - na repetidíssima frase de Ruy Barbosa* -, a fim de obter igualdade, devamos tratar desigualmente os desiguais.

Ora, não há estados iguais na federação brasileira, da mesma forma que não há cidades iguais no Brasil. Portanto, se cidades e estados são diversos, multifacetados são também seus costumes, pactos e particularidades de convívio. Nesse sentido, a democracia deve contemplar cada cidade e cada estado em sua própria e particular forma de participar na federação.

Da mesma maneira, o convívio em qualquer dimensão pressupõe acordos, convênios e pactos essenciais ao regramento cotidiano. A fim de manter a estabilidade, esses acordos comunais – e o direito antigo já os sabia desde sempre – devem ser cumpridos. Pacta sunt servanda: é da inteligência jurídica romana que os acordos devem prevalecer enquanto permanecer a situação que os gerou.

Tal princípio basilar do direito civil e do direito dos povos não preponderou na nova divisão do petróleo proposta pelo Deputado Ibsen Pinheiro. Argumentou o Parlamentar, com meia razão, que os proventos do petróleo devem ser repartidos por igual na federação. O raciocínio não é de todo errado, desde que feito com as novas reservas, a serem descobertas daqui para frente.

Ilógica e carente de bom senso é a inversão tributária ocorrida a partir da emenda ao Projeto de Lei então apresentada**. E, pior ainda, pretende-se agora que a União pague pelo problema que não criou.

Grosso modo, a sociedade pátria desapercebeu-se que não se tratava apenas de um “choro” do Rio de Janeiro. O que ocorreu foi verdadeira quebra de contrato.

Por exemplo, apenas para dimensionar o tamanho do problema, o ICMS dos derivados do petróleo é cobrado apenas no estado em que se comercializam os produtos – e não pela regra tradicional, segundo a qual o imposto deveria ser cobrado no estado de origem. Salvo engano, não ouvi nenhum debate acerca do reacerto desta taxa.

Diante de tal cenário, Gilberto Amado não poderia ter maior razão: vivemos “uma série de esforços arquejantes, que não se conjugam, não se integram num conjunto. Não conhecemos a marcha continuada, o lento ascender de passo firme. Vivemos sempre a recomeçar”. Nosso regime parece ser o da inconseqüência.

>> Conselho; Marcelo D2 e Marcelo Mira; Álbum Desconhecido
>> Diário de Bordo: A Viagem Presidencial de Tancredo; Rubens Ricupero; Imprensa Oficial

* Em seu texto, o jurista baiano parecia conduzir às lições de Aristóteles sobre justiça distributiva: a igualdade citada era, em essência, uma proporção a ser aplicada na divisão de objetos entre pessoas. Caso os prezados queiram se aprogundar, vejam o livro V da Ética a Nicômaco.

** Ao contrário do que muitos jornalistas afirmaram, a proposta do pré-sal não trata de Emenda Constitucional.

Friday, March 26, 2010

Os Outros: George Best

"Gastei meu dinheiro com mulheres lindas, carros possantes e casas maravilhosas. O resto, desperdicei."

O glorioso jogador George Best, no campo da filosofia.

>> Jumpin' Jack Flash; Ananda Shankar; What It Is! Funky Soul and Rare Grooves (1967-1977)
>> Diário de Borodo: A Viagem Presidencial de Tancredo; Rubens Ricupero; Imprensa Oficial

Sunday, March 21, 2010

Conselhos ao B.

#10 A política pode ser uma atividade nobre.
Conforme a frase de Václav Havel: "genuine politics - even politics worthy of the name, the only politics I am willing to devote myself to - is simply a matter of serving those around us: serving the community and serving those who will come after us. Its deepest roots are moral because it is a responsibility expressed through action, to and for the whole".

>> Head On; Legião Urbana; Acústico MTV
>> Umbigo Sem Fundo; Dash Shaw; Quadrinhos na Cia - um dos melhores quadrinhos que li recentemente.

Friday, March 12, 2010

Adiós, Glauquito


Silêncio, o artista sai de cena. Não há o que dizer.


Cresci rindo e me divertindo com as piadas, infâmias e ironias do Glauco. Somente os que leram as revistas sabem o sentimento daqueles de minha geração.

Passei a adolescência lendo as revista do Glauco, do Angeli e de todos os demais ilustradores da pós-redemocratização. Eram sempre piadas engraçadas, aliadas a traços originalíssimos e muita crítica social – elemento comum a um país sedento por democracia.

As histórias do Glauco agradavam a jovens e adultos. Alegravam, inclusive, meu pai: o Geraldão foi um dos primeiros quadrinhos que lemos juntos durante minha adolescência e por meio do qual trocamos algumas confidências.

Por isso, a odiosa morte do artista é, também, a perda de um dos mais originais expoentes do humor brasileiro dos anos 80. É um de “Los 3 Amigos” que se vai.

A perda – na circunstância em que ocorreu – é ainda pior, pois plenamente evitável. Diante da violência fica a sensação de impotência e indignação.

Todavia - e felizmente -, a arte do desenhista sobreviverá ao tempo. Sobre o assunto, vale ler excerto de um livro chamado “Tumbas”, escrito por Cees Nooteboom e belamente editado pela Actes Sud. A obra é um tanto soturna – traz fotos de 82 túmulos de escritores e filósofos famosos -, mas a beleza do texto merece citação:

A maioria dos mortos se cala. Eles não falam mais nada. Eles já disseram literalmente tudo o que tinham para dizer. Com os poetas é diferente. Os poetas continuam a falar. Eles têm a peculiaridade de se repetir. É o que acontece cada vez que um leitor lê ou recita um de seus poemas, pela segunda ou a centésima vez. Mas os poetas se dirigem da mesma forma aos que ainda não nasceram, às pessoas que ainda não viviam quando eles escreviam o que escreviam. (...) Esta pessoa ainda fala conosco, ainda nos diz algo, algo que ainda ecoa em nossos ouvidos, algo que guardamos e que talvez não esqueçamos nunca mais, algo que decoramos e que, de vez em quando, repetimos alto ou em voz baixa”

Dessa forma, o presente texto é minha tentativa de homenagear um sujeito que foi bacana durante minha juventude, alguém que fez a mim e aos meus amigos rirmos muito. Em momentos os mais simples, as tirinhas do Glauco foram impagáveis.

Bzzzzz.

>> La Vie en Rose; Louis Armstrong; Wall-E
>> Direito Agrário Brasileiro; Benedito Ferreira Marques; Atlas