Saturday, October 18, 2008

Stand By Me


Desde o começo da crise financeira, os investidores têm abandonado os mercados do Terceiro Mundo e procurado guarida no pretenso porto seguro representado pelos EUA. No caso do Brasil – que abriga o mais dinâmico centro financeiro da América sulina -, esse efeito tem causado graves conseqüências: a rápida desvalorização do Real frente ao Dólar é um dos exemplos.

Apesar de o verdadeiro impacto na economia brasileira ser ainda difícil de mensurar, analistas têm afirmado que o tamanho do buraco pode chegar a cerca de 28 bilhões de dólares. Em sua maior parte, esse numero deve-se a investidores que apostaram no Real e estão sangrando com a alta da moeda norte-americana. No médio prazo, o Brasil pode até se recuperar do problema, dadas as reservas petrolíferas recentemente descobertas e a grande diversificação da economia. O impacto regional dessa queda, no entanto, pode não desaparecer tão cedo – o que é de suma importância para a Argentina, um grande parceiro do Brasil.

Atualmente, a Argentina está atada a um taxa em torno de 3,2 Pesos argentinos para cada dólar. Assim, quanto maior a queda do Real frente à moeda estadunidense, maior a desvalorização de nossa moeda frente ao Peso. Embora essa mecânica seja positiva aos importadores argentinos, é grande o desastre junto aos importantes setores exportadores portenhos: o Brasil é responsável por 24% das exportações argentinas, e esses números representam algo perto de 13% do orçamento governamental.

Com o inesperado impacto do Peso em relação ao Real, nosso país terá de pagar muito mais pelas mesmas importações, praticamente inviabilizando o comércio Brasília-Buenos Aires. No outro lado da balança, o pais portenho – que vê sua participação mundial declinar após alguns anos de breve recuperação – encontra-se mal posicionado para absorver os impactos de exportações em queda.

A agricultura, nesse cenário, é o setor mais critico, no sentido de que o declinante mercado exterior tende a não encontrar saídas que compensem eventuais perdas. Dessa forma, tanto o comércio quanto a produção agrícolas poderiam retroceder – trazendo efeitos ainda mais devastadores ao combalido mercado argentino. Em um contexto de falta de alimentos, ainda que Buenos Aires opte por importar comida brasileira, a diferença cambial tornaria tal política sem efeito. Forçando, assim, assustadoras hipóteses de ausência de alimentos, queda nos lucros e risco de potenciais crises na economia como um todo. Conforme o antigo ditado popular: onde falta pão, há confusão.

Para além de todas essas dificuldades, à economia portenha facultaria tentar redirecionar-se em busca de novos parceiros. Entretanto, alterar relações comerciais não é algo que ocorra da noite para o dia – e a redução da economia global não iria ajudar no processo. Ademais, uma mudança de tamanha envergadura na pauta de exportações implicaria ampla base creditícia, elemento que a Argentina não detêm já a algum tempo.

Poder-se-ia, ainda, tentar ajustar o câmbio em favor de uma melhor relação com o Real. Todavia, tal política parece sobremaneira fadada à destruir os números governamentais. Basta, nesse caso, lembrar dos desastrosos impactos da manutenção do Peso valorizado frente ao Dólar no final do século passado.

Portanto, o que você faria se estivesse sentado dentro da Casa Rosada nesse momento? Na velha piada política, escrever a terceira carta parece ser o conselho mais sensato: são muito limitadas as opções do governo Kirchner, ao mesmo tempo em que o apoio popular parece tender à erosão tão logo uma crise se acirre.

No exemplo do Brasil, o resultado de todo esse cenário é ainda difícil de medir: os fundamentos econômicos brasileiros, apesar de tudo, são sólidos - malgrado alguns lamentos prenunciados pela crise financeira. Buenos Aires, por outro lado, pode estar diante de uma potencial desestabilização que, a meu ver, o governo populista “kirchneriano” não terá como suportar. Lamentavelmente, nada poderia ser mais próximo de um tango de Gardel.

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